domingo, 28 de novembro de 2010

A esperança em dez cordas


Hamilton de Holanda é um homem de seu tempo. Reinventa seu instrumento, ampliando suas possibilidades de expressão (entre elas, o auto-acompanhamento); conecta ouvintes e músicos de todo o mundo em novas plataformas tecnológicas, onde divulga seu trabalho e funda amizades; revira o baú das nossas melhores memórias musicais; e percorre os cinco continentes desbravando novas audiências e novos encontros (que vão dos venezuelanos do Ensamble Gurrufio ao ex-Led Zeppelin John Paul Jones). Não utiliza a tradição como biombo para certa auto-indulgência criativa nem vende a alma às tentações fugazes da contemporaneidade, da música de mercado e de outros faustos do tipo. Sua carreira é uma celebração permanente e otimista de nossos dias, em que utiliza como armas repertórios de todas as épocas mas também mira o futuro propondo novas composições.
Seu disco mais recente é mais um capítulo nesse caudaloso e compassado discurso sobre nosso tempo que Hamilton vem construindo há mais de quinze anos. Esperança, resumo de uma turnê pela Europa em que o brasileiro subiu em palcos da Finlândia, Áustria, França, Alemanha e Suíça acompanhado apenas de seu bandolim de dez cordas. Nas primeiras audições, lembrei-me de Keith Jarrett, pela aventura individual da improvisação; e também de Jacob, pela virtuose, pela matriz rigorosa a partir da qual Hamilton pode expandir seu som. Lembrei-me de Luperce Miranda, pela sonoridade que sugeria o encontro de dois ou três  bandolins ao mesmo tempo quando era apenas um que se projetava no palco.
Mas o som que brota do disco é fugidio a esses paradigmas. É Hamilton que se pronuncia ali, inteiro, corajoso, monumental. Contemporâneo ao revisitar a tocante "Vou vivendo", de Pixinguinha; e "Canto de Ossanha", de Vinícius e Baden. Lírico ao se debruçar sobre as notas redundantes de "O que será", de Chico; ou sobre as encruzilhadas bachianas de "7 anéis" de Gismonti. Inventivo - e quase figurativo - em suas próprias "Esperança", "Pros anjos" e "Ettiene".
Um disco para se sentir vivo e para saber da vida em nossos dias. Vida longa a Hamilton e suas cordas!

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