quarta-feira, 22 de abril de 2009

Sertão do dia


Pelo sertão não se tem como
não se viver sempre enlutado;
lá o luto não é de vestir, 
é de nascer com, luto nato. 

Sobre de dentro, tinge a pele
de um fosco fulo: é quase raça;
luto levado toda a vida
e que a vida empoeira e desgasta.

E mesmo o urubu que ali exerce,
negro tão puro noutras praças,
quando no Sertão usa a batina
negra-fouveiro, pardavasca.

João Cabral de Melo Neto, O Luto no Sertão.

Um comentário:

Américo Souza disse...

"No sertão reinava o respeito natural pela propriedade; ladrão era, e aina é hoje, o mais afrontoso dos epítetos; a vida humana não inspirava o mesmo acatamento. Questões de terra, melindres de família, uma descortesia mesmo involuntária, coisas às vezes de insignificância inapreciável, desfechavam em sangue. Por desgraça não se dava o encontro em campo aberto: por trás e um pau, por uma porta ou janela aberta descuidosamente, na passagem de um lugar ermo ou sombrio, lascava o tiro assassino, às vezes marcando o começo de longa série de vendetas"
Capistrano de Abreu, "Capítulos de Hstória Colonial" (1907).