terça-feira, 13 de julho de 2010

A volta ao Moura em 10 discos


Paulo Moura (1932-2010) era um virtuose indomável, que, além dos cromatismos ferozes, desbravou novos terrenos de sonoridade e de respiração na clarineta e no saxofone. Exemplo foi sua gravação para o "Moto Perpétuo", de Paganini, para o qual desenvolveu uma técnica de respiração ainda em meados dos anos 50. Também foi um aranjador com rara sensibilidade para a orquestração, como provam seus discos dos anos 60 gravados com seu quarteto e com seu hepteto; e um artista cujo espírito se voltou - com iguais doses de aclamação nos cinco continentes, por onde gravou e tocou - para dezenas de gêneros musicais: do erudito ao chorinho, da gafieira ao jazz, do samba à MPB, da bossa nova ao forró.
Para saudar a memória deste que foi um dos maiores músicos do mundo, de todos os tempos, este Talabarte reuniu o que considera o seu top ten, os dez discos que melhor evidenciam a grandeza do nome de Paulo Moura.


1. Quarteto (1969)
A escalação do quarteto a que o nome do disco se refere fala por si só: Paulo Moura (sax alto), Wagner Tiso (piano), Luiz Carlos (contrabaixo) e Paschoal Meirelles (bateria). No repertório, "Lamentos do morro" (Jobim/Vinícius), "Eu e a brisa" (Johnny Alf), "Aos pés da cruz" (Marino Pinto/Zé da Zilda), entre outras. Aqui, Paulo volta suas atenções para o diálogo entre o samba e o jazz, pedra filosofal da bossa nova, mas que em seu saxofone encontrou uma expressão insuperável pela liberdade trilhada em cada arranjo e pela audácia em cada improviso. Destaque para "Yardbird suite", que traz Charlie Parker para balançar ao som do samba.


2. Fibra (1971).
Sai Paschoal Meirelles e entra Robertinho na bateria. Ao antigo quarteto, juntam-se nomes como Marcio Montarroyos (trumpete), Oberdan Magalhães, futuro líder da Black Rio (sax tenor e flauta), Cesário Constâncio (trombone), Tavito (guitarra) e Milton Nascimento (que toca piano na faixa "Ana Lia's Blues"). A engrenagem musical é ampliada e o repertório também percorre novas veredas, refletindo a ascensão de sonoridades que iriam marcar parte importante da música brasileira dos anos 70. Destaque para uma "Cravo e canela", cheia de balanço e costurada pela percussão de Robertinho e pela flauta de Oberdan Magalhães.


3. Confusão urbana, suburbana e rural (1976).
Marco de sua consagração popular, esse disco traz aquela que é a versão mais exuberante e também a mais difícil para "Espinha de bacalhau", o intrincado choro de Severino Araújo, cujas cascatas de notas são atacadas por Moura com incomum velocidade e brilho. Como o nome antecipa, o disco explora temas urbanos, como o jazz "Pedra da Lua" (Toninho Horta); suburbanos, como as versões de "Notícia" (Nelson Cavaquinho), "Peguei a reta" (Porfírio Costa) e "Amor proibido" (Cartola); e também temas rurais como "Carimbó do Moura" (uma de suas raras e belas composições).


4. Paulo Moura e Clara Sverner (1983).
Na praia da chamada música erudita, Paulo Moura foi músico da orquestra do Teatro Municipal (RJ) e tocou sob a regência de maestros como Leonard Bernstein, Eleazar de Carvalho, Isaac Karabtchevsky e, niguém menos, Stravinsky. Portanto, também se sente à vontade em meio ao repertório de compositores como Villa-Lobos, Marlos Nobre, Gilberto Mendes, Eduardo Souto e Jacques Ibert, que formam a base desse disco antológico de 1983. O registro é o principal capítulo da produtiva parceria musical com a pianista Clara Sverner, com quem Moura realizou diversos shows e gravações.


5. Mistura e Manda (1983)
O ano de 1983 foi um dos mais produtivos na carreira de Moura. Além da parceria com Clara Sverner, ele também gravou o LP Mistura e Manda, outro marco em termos de aclamação popular em sua carreira. O foco principal é o chorinho, gênero que explora em sete faixas acompanhado por uma verdadeira constelação de instrumentistas: César Farias, Joel Nascimento, Rafael Rabello, Zé da Velha, Jonas Pereira, Jorginho do Pandeiro, Maurício Carrilho e Mané do Cavaco. Destaque para a longa versão de "Chorinho pra você", uma nova incursão de Paulo pelo repertório de Severino Araújo, em que duela com o violão engenhoso de Rafael Rabello. Em 1997, o disco foi editado em CD com outra capa e outro nome, Tempos Felizes.


6. Dois Irmãos (1992)
Registro precioso do encontro entre Paulo Moura e Rafael Rabello. No encarte do disco, João Máximo resume a emoção de se escutar esses dois gênios. "Ouçam como os dois passeiam à vontade tanto pelo asfalto paulistano de Ronda e Sampa como pelo chorão carioca de terra batida de Chorando Baixinho e Chorinho em aldeia. observem como a sofisticação de Luiza não briga com o brejeiro Um a Zero. Atentem para o fato de o seresteiro Violão Vadio não se opor à gafieirice de Domingo no Orfeão Portugal. Tardes de chuva e tempos felizes cabem nessa fascinante viagem de Paulo Clarinete e Raphael Violão pelos caminhos da música. E quem disse que o casamento perfeito não existe?"

7. Pixinguinha (1997).
Tributo a Pixinguinha gravado ao vivo em São Paulo em 1997, esse disco ganhou o prêmio Sharp de Melhor Produtor de Música Instrumental para Paulo Moura e também o de Melhor Grupo de Música Instrumental. O grupo, no caso, era uma versão contemporânea dos oito batutas de Pixinguinha que trazia, além de Paulo nos sopros e arranjos, Jorge Simas (violão), Márcio (cavaquinho), Jorginho (pandeiro), Jovi (percussão), Marçalzinho (percussão), Trombone (Zé da Velha) e Joel Nascimento (bandolim). Destaque para a versão de "Mistura e Manda", com direito ao colossal solo de pandeiro de Jorginho.


8. Rhapsody in bossa - P. Moura visita Gershwim e Jobim (1998)
"Não será o jazz que influencia o samba - é a bossa nova brasileira que vai reler o jazz... Gershwin e Jobim, tão branquinhos e tão amarrados na música negra...". A frase de Paulo Moura fecha o encarte desse disco gravado ao vivo e que presta uma homenagem a dois ícones da música nas Américas. O texto soa como uma carta de princípios com que Paulo opera seus encontros musicais, sem tentar encaixar a música brasileira a nenhum compasso estrangeiro, mas fazendo referências universais da música se reencontrarem e se redescobrirem à luz de nossos ritmos e arranjos. Destaque para as belas versões de "Falando de amor" e "Embraceable you".


9. Samba de latada (2006)
Tanto o termo "forró" quanto o termo "samba" serviam, no Nordeste do século XIX e início do século XX, para designar uma festa regada a muita dança e música. "Depois que o samba carioca foi alçado à música da nacionalidade, foi que o samba passou a designar um gênero musical. No Nordeste ele foi adaptado para a sanfona, o triângulo, a zabumba, mais violões, banjo e instrumentos de sopro", lembra o jornalista José Teles. Ao lado de Josildo Sá, Paulo evidencia o caráter múltiplo de sua virtuose e percorre o universo do chamado "samba de latada" para fazer um dos melhores discos brasileiros dos anos 2000. Originalmente lançado de forma independente em 2006, o disco ganhou reedição pela Rob Digital no ano seguinte.


10. Afrobossanova (2009)
Escolhido por este Talabarte como um dos melhores discos do ano passado, Afrobossanova é o registro do show homônimo em que Paulo percorreu o Brasil ao lado de Armandinho, outro titã da música brasileira. O disco é eletricidade pura, uma celebração musical em altíssima voltagem que descobre, propõe e amarra novos nós entre o jazz, a bossa nova, o samba e o chorinho a partir da música de Tom Jobim. "Uma confusão urbana, suburbana e inter-racial", como propõe o encarte do disco. Destaque para a versão de "O morro não tem vez", com seu arranjo pontuado pela força da percussão afro. Um momento inesquecível!

2 comentários:

marvioli disse...

Felipe

O disco do Paulo com a Clara tocando Pixinguinha é fantástico

marvioli disse...

Felipe

o disco do Paulo com a Clara tocando Pixinguinha é excelente.
Marcus Vinicius