No meu diário de leitor, o reencontro com a obra de dois escritores é sempre uma alegria renovada: Italo Calvino e Guimarães Rosa. Por esses dias, andei me metendo de novo pelas veredas infinitas e circulares dos sertões do mineiro. Fascinante! Sempre.
Desta vez, usei como bússola algumas coisas escritas por gente como Clenir Bellezi de Oliveira e Walnice Nogueira Galvão, que oferecem chaves preciosas para se compreender a grandeza da literatura de Guimarães Rosa, a partir, por exemplo, da fluência do autor em várias línguas. "Acho que estudar o espírito e o mecanismo de outras línguas ajuda muito a compreensão mais profunda do idioma nacional. Principalmente, porém, estudando-se por divertimento, gosto e distração", afirmava o escritor, fluente em quase uma dezena de idiomas. Essa intimidade com outros dizeres abriu seu caminho entre a coloquialidade sertaneja, com que revestiu de luz e grandeza personagens como Riobaldo, Miguilim, Nhinhinha, Sorôco, entre inúmeros outros. A filosofia de sua obra pode ser compreendida como uma investigação da própria língua, que se abre para um carrossel de sentidos absolutamente original.
Seus aforismos, por exemplo, são indissociáveis de um jogo particular com a linguagem. Como em "Moço!: Deus é paciência. O contrário, é o diabo". Ou "O senhor sabe o que o silêncio é? É a gente mesmo, demais". Não se trata apenas de "dizer" a realidade a partir da linguagem, mas de procurar em meandros e engenhos da língua camadas e matizes invisíveis dessa realidade. A luminosidade de sua literatura se dá porque, nela, o ser humano toma consciência de si a partir de uma linguagem rearticulada espontaneamente ao sabor das inquietações e da experiência dos próprios personagens; e não engessadas por cânones específicos. Em Rosa, a vida só é possível a partir da literatura.
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