Moacir Santos foi muito mais do que um dos maiores maestros da nossa música. O gênio pernambucano personificou aquilo que é raiz e fruto, origem e destino da nossa musicalidade: essa capacidade ilimitada de incorporar códigos e influências de outras latitudes e colocá-los a contraluz de nossos batuques e de nosso lirismo melódico e harmônico. Moacir foi mestre nessa estratégia de afirmação de uma cultura que sabe das outras sem deixar de saber de si. "Moacir Santos sempre esteve, sozinho, na esquina em que a Orquestra Tabajara encontra Gil Evans, na confluência inimaginável entre a jazz band (de vanguarda), a gafieira e a batucada. Mas como um compositor clássico tomando um trago na Praça Tiradentes, batizou suas peças seminais como Coisas - também nome de um dos discos mais importantes da música brasileira, de 1965 - e numerou-as à maneira de um Bach", escreve o jornalista Paulo Roberto Pires num texto publicado no saudoso nominimo logo depois da morte do maestro, em 2006.
Moacir apresentou-se ao mundo da música fazendo hard bop com um pé no agreste e outro no Beco das Garrafas. Uma de suas Coisas, a no. 5, "Nanã", foi a Garota de Ipanema de uma bossa nova que não recendia a barquinho, beijinho e mar. Mas a terra, sangue, magia e candomblé. E quase tão gravada quanto o hino de Tom e Vinícius. Nas religiões afro-brasileiras, dependendo da leitura mitológica que se faça, Nanã é a orixá austera, que cuida dos mortos para embalar o renascimento. Na trajetória de Moacir foi ela quem fez renascer o menino pobre e analfabeto do Interior pernambucano. E o fez na forma de um maestro genial, que entortava harmonias qual um garrincha da partitura. Celebrado no Exterior e praticamente desconhecido em seu País, Moacir só veio ganhar flores por aqui nos anos 90, graças ao esforço de Mário Adnet e Zé Nogueira. Foram eles os produtores do monumental Ouro Negro, CD duplo que apresentou Moacir Santos a meio mundo de ouvintes. Eu, entre eles.
Abaixo, o maestro com a banda Savana, num registro da TV Cultura
3 comentários:
Sensacional o post! Moacir foi (e é) um gigante.
passe lá
www.somimaginario.blogspo.com
Felipe, coincidentemente, agora estava ouvindo o disco "Vinícius & Odete Lara", de 1963. O arranjador era Moacir Santos!
Abraços.
Fernando, parabéns pelo Blog. Já adicionei entre os meus favoritos aqui do Talabarte. Tiago, esse é um de meus discos preferidos do Poetinha. Aliás, os registro desse selo do Aloysio de Oliveira são todos formidáveis.
Forte abraço.
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