quinta-feira, 5 de março de 2009

O ministro, o trombone e o MST


Diante dos recentes incidentes em Pernambuco envolvendo fazendeiros e o MST, os setores conservadores da sociedade e da imprensa se articulam, mais uma vez, para arrastar a opinião pública para dentro de seu vórtice de intolerância, preconceito e desinformação no que diz respeito à questão agrária e aos movimentos sociais no Brasil. Gilmar Mendes começou a soprar o trombone e lá se foi a pauta nacional divisar tópicos como "ilícitos", "repasse ilegal de dinheiro público" e "revolução" no que é, a rigor, mais um entre os milhares de casos de conflito no campo registrados desde sempre no Brasil.
Poucos foram os que conseguiram encarar o fato dentro de seu justo contexto e sem o ranço ideológico que costuma emperrar o debate sobre a situação do campo no Brasil à esquerda e à direita das porteiras. Em louvável editorial, o jornal O POVO diz que "é cedo para se emitir juízo de valor sobre o incidente, tendo em vista o histórico de injustiças cometidas no campo. É preciso aguardar a conclusão do inquérito policial".
E arremata: "A Revolução de 30 modificou um pouco o predomínio absoluto dos oligarcas do café, do leite, no Sudeste do País, e dos 'coronéis' (latifundiários) nordestinos. Abriu oportunidade para a participação da burguesia nacional nas decisões políticas. Mas teve o mérito de despertar a consciência nacional para a questão agrária. Desde então, como bem disse o ministro Tarso Genro, vêm ocorrendo ações cíclicas, com avanços e retrocessos: Ligas Camponesas anos 50 e 60 e, mais recentemente, o MST. Cabe ao MST, no entanto, a responsabilidade de evitar provocações nas pressões pela reforma agrária".
Outro texto auspicioso foi do colunista Clóvis Rossi, na Folha do último domingo. Para o jornalista, pinçar o MST entre os que supostamente praticam ilicitudes e recebem dinheiro público soa a viés ideológico, incabível em funcionários do Poder Judiciário, numa referência a Gilmar Mendes. "Importantes líderes do PT enfrentam processo no próprio STF. O PT, como os demais partidos, recebe dinheiro público. O governador afastado da Paraíba, Cássio Cunha Lima (PSDB), perdeu o cargo por compra de votos. O PSDB recebe dinheiro público".
A pergunta de Rossi é se PT e PSDB devem responder pela ilegalidade de alguns de seus membros. Ele lembra que nem o caso de petistas nem o caso de tucanos percorreram todas as instâncias e, portanto, poder-se-ia cobrar dos analistas de plantão a sentença que condena o MST por ilegalidades. "O problema não é se o dinheiro chega ou não ao MST, mas se é ou não bem empregado". Esse, no entanto, jamais será o entendimento de quem não compreende que ocupar/invadir terras terras é a única maneira que um movimento social voltado para a reforma agrária tem para chamar atenção para sua agenda.
Se o País não encara de maneira honesta essa questão, que traz consigo inúmeras contradições, não resolverá jamais sua questão social. Pior: vai continuar confundindo assessoria técnica a assentamentos e programas educacionais internacionalmente reconhecidos com atos "ilícitos" como quer propor Gilmar Mendes, cujo ego já de muito não cabe mais em sua toga.

Um comentário:

Américo Souza disse...

Belo post. Preciso, sóbrio e com uma pitada leve, saudável e necessária, de paixão pelo bom jornalismo. Bem vindo de volta à terrinha!