segunda-feira, 29 de junho de 2009

Diploma de jornalismo: "cenário brasileiro é exótico", condena advogado


Em artigo publicado na Folha de São Paulo, o advogado José Paulo Cavalcanti (ex-presidente da Empresa Brasileira de Notícias) reposiciona o debate sobre a exigência - ou a falta dela - do diploma de jornalista para o exercício da profissão. "Não, o diploma dos jornalistas não acabou. A decisão do Supremo Tribunal Federal, na última semana, limitou-se a dizer que o decreto-lei 972/69 era incompatível com a Constituição democrática de 1988. Mais nada", escreve o advogado. Tecnicamente, a decisão do STF, de acordo com Cavalcanti, é correta na medida em que não poderia deixar vigendo uma regra acessória do decreto-lei (justamente o artigo 4, que prevê a exigência) enquanto o decreto em si já havia sido refutado pela Corte. Não houve, e aqui vale o destaque, julgamento sobre o diploma, que poderá voltar a ser exigido em lei.

Sobre as declarações de Gilmar Mendes a respeito a possibilidade de um projeto de lei infra-constitucional restabelecer a obrigatoriedade do diploma - classificado como inconstitucional pelo comandante falastrão do STF -, Cavalcanti diz que são apenas "palavras ao vento". "Gilmar Mendes, mais uma vez, expressa opinião pessoal sobre tema que pode vir a ser discutido no Supremo - em vez da reserva que, como regra, a seus ministros conviria guardar em situações assim".

Enquanto o diploma não volta à pauta da Justiça, alguns números levantados por Cavalcanti cutucam o vespeiro com lâminas mais afiadas. O primeiro deles é o de que o modelo de "desregulamentação absoluta" - como a que se coloca agora no Brasil - existe apenas em três países (Chile, Áustria e Suíça). Outros 14 ainda compartilham do já antigo modelo brasileiro; entre eles, Bélgica, África do Sul e Arábia Saudita. Nos demais países, a questão é matizada, mas nenhum deles prescinde de algum tipo de regulamentação em torno da profissão (escolaridade, ausência de condenação penal, algum curso médio ou superior, curso preparatório específico, estágios compulsórios).

"Na Alemanha, por exemplo, quase nenhum jornal importante contrata quem não tem diploma. Nos Estados Unidos, onde ele também não é exigido, há 400 faculdades, 120 cursos de pós-graduação e 35 doutorados; sem contar que, na média, 80% das Redações são compostas por diplomados", cita. "Maior diferença, entre Redações brasileiras e estrangeiras, é precisamente a quantidade de jornalistas com cabelos brancos: abundantes, nas democracias consolidadas, e escassos, no Brasil, pelo uso indiscriminado de estagiários, lumpens na profissão, mão de obra jovem e barata".

Vale ler a conclusão do artigo:

"Mas por que jornais, em regra, tanto querem jornalistas diplomados? A resposta é simples. Por ser dispendioso ensinar, dentro das Redações, a fazer um jornal. E também porque jornalistas aprendem, nas universidades, que errar custa caro. Nos Estados Unidos, com vitória dos demandantes em 75% dos casos, a média das indenizações oscila entre US$ 100 mil e US$ 200 mil dólares.

Com frequência, vai muito além disso. Por exemplo: Leonard Ross x New York Times, US$ 7,5 milhões; Richard Sprague x Philadelfia Inquirer, US$ 34 milhões; Victor Feazel x Dallas Television Station, US$ 58 milhões; Wall Street Journal x Money Management Analytical Research, US$ 222,7 milhões.

Dando-se então que jornalistas formados, por estatisticamente errar menos, valem mais. E ganham bem mais também, claro. Desde que haja leis de imprensa decentes, faltou dizer. O que nunca tivemos -e continuamos sem ter.

Posta a questão em tons técnicos e mais serenos, o que se vê hoje em nosso país é um cenário anormal. Exótico. Porque, em toda parte, são os próprios jornalistas que não aceitam a exigência do diploma, enquanto aqui sua defesa é feita pela Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas). E empresas sempre pedem diploma - enquanto aqui as restrições contra ele partem de um de nossos mais respeitados jornais, a Folha de S.Paulo.

Dando os trâmites por findos, assim, cumpre agora esperar por legislação específica do Congresso Nacional - a quem cabe, com mais propriedade e mais legitimidade, estabelecer requisitos para o exercício das profissões. A ele cumprindo, afinal, decidir se o diploma deve ser mesmo exigido.

Ou não".

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