O "pioneirismo" de João Gilberto tem alguns antecessores que desestabilizam a noção consagrada de que a música brasileira se divide entre antes e depois do baiano. É fato: João inaugurou não só um estilo ao violão (onde emulava o som do tamborim de uma escola de samba nas cordas agudas, acompanhadas de notas contínuas nos bordões) como também um modelo de relação entre voz e (auto-)acompanhamento que consagraria a bossa nova. No entanto, em seu estilo vocal - e essa é uma discussão já repisada - ressoam referências de cantores que bem antes do bim bom sincopado de João faziam da leveza e da divisão virtuosa um contraponto ao dó de peito da "velha" guarda (em que pese o fascínio de João pela grandiloquência de Orlando Silva). Mário Reis talvez seja o exemplo mais evidente dessa linhagem que desaguaria em João Gilberto e seu paroxismo minimalista. Outro é Ciro Monteiro, o sambista boa praça que foi um equilibrista elegante de notas, pausas e síncopes. Um dos grandes intérpretes do chamado "samba sincopado" (como se houvesse samba sem síncope), na voz do Formigão (como Ciro era chamado pelos amigos), as sílabas parecem parar no ar, tranbordando pelos compassos e reinventando a pulsação do tempo em marcações tão inusitadas quanto originais. Ciro faleceu aos 60 anos, em 1973.
Nenhum comentário:
Postar um comentário