segunda-feira, 1 de julho de 2013

O velho novo Maracanã



No início era o rádio, mais precisamente a rádio Nacional, que fazia o futebol carioca - assim como o samba - galvanizar o País. Com isso, para algumas gerações de torcedores brasileiros os clubes do Rio de Janeiro eram, ao lado de suas paixões regionais, efetivamente uma paixão nacional. Até os anos 90, raros eram os torcedores que, fora de São Paulo, por exemplo, torciam para clubes paulistas. Até então, salvo as disputas locais, o Brasil parecia se dividir entre os torcedores de Flamengo, Vasco, Fluminense e Botafogo. E os ídolos vinham quase todos de lá: Zizinho, Zico, Garrincha, Roberto Dinamite, Dida, Manga, Nilton Santos, Didi, Gerson, Assis etc.
Todo aquele carisma irradiado nacionalmente a partir do Rio tinha um palco, um templo que calava no coração e no imaginário de todo torcedor; o estádio Jornalista Mário Filho, o Maracanã, patrimônio material - e imaterial, pelas suas lendas, histórias e dramas - de todo apaixonado por futebol.
“Maracanã é nossa catedral /E com a Mangueira do seu lado, é bom sinal. /É futebol! /É carnaval! /Paixão igual a do meu povo /Eu não conheço nada igual”, canta Francis Hime na letra de Paulo César Pinheiro. “Domingo, eu vou ao Maracanã /vou torcer pro time que sou fã”, arrebatava Neguinho da Beija Flor. E, durante décadas, o Brasil inteiro, mesmo o torcedor que restava a milhares de quilômetros da Cidade Maravilhosa, “ia junto” com o sambista, com foguetes e bandeiras imaginárias, sagrar-se campeão.
O jogo de hoje entre Espanha e Brasil - para o bem e para o mal - leva novos tempos ao velho Maraca. Os clubes cariocas já não desfrutam do mesmo prestígio em âmbito nacional e vivem em estado pré-falimentar. O futebol, cada vez mais elitizado, virou um business cínico e calculista e a alegria popular da geral foi expulsa da arquitetura corrente. 
A quem serve esse novo gigante de concreto, não sei ao certo. A Copa das Confederações é um torneio atípico e, em sua partida final, certamente vai lotar todos os setores do estádio. Mas fico me perguntando como será a relação entre o estádio e o torcedor em campeonatos “reais”, como os deficitários campeonatos Carioca e Brasileiro.
Jogar no Maracanã era motivo de orgulho para todo desportista. Ser campeão em seu gramado, então, a glória suprema do futebol. Nesta Copa das Confederações, entretanto, atletas espanhois e italianos, por exemplo, já esbanjaram certa indiferença em relação à mitologia e à história do estádio. E mesmo para alguns jogadores brasileiros, tenho lá minhas dúvidas se fará tanta diferença ser campeão no Maraca ou em outro estádio qualquer.
É que a reforma recente, por mais luxuosa (e imoral em seus gastos), fez do Maracanã justamente um estádio qualquer. É o mesmo tipo de estádio que poderíamos encontrar em outros países; e, para completar, ainda bem menor, não mais o maior do mundo. Algo de muito valioso se perdeu junto com seus traços arquitetônicos originais. A partir de hoje, uma nova história começa a ser escrita.
* Texto publicado no caderno de Esportes do O POVO, edição de domingo, dia 30 de junho de 2013

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