terça-feira, 7 de junho de 2011

A ciência do diálogo


Penso a revista Entrevista, produzida pelos alunos da disciplina Laboratório de Jornalismo Impresso do curso de Comunicação Social da UFC, como a expressão de um espelho da universidade pública brasileira. Reflexo de possibilidades e impasses, de projetos e vocações que se perdem e se afirmam entre o que poderia ser e o que é efetivamente. Embora corrente - e muitas vezes redentora num país de tintas sociais tão desiguais -, creio distorcida a visão de que a Universidade tem por premissa fundamental abrir portas do mercado. Para isso, há no sistema educacional outras importantes instâncias de inclusão. O discurso do ensino superior como trampolim de oportunidades encerra uma tautologia que é tão mais redutora quanto mais distante daquilo que está no cerne de seu objeto: o saber. Não aquele "saber" excludente, preconceituoso e que se estabelece como instrumento de poder. Mas o livre-saber, que é fim em si mesmo (para, dentro da aventura do conhecimento, virar um novo recomeço em seguida) e que serve de alicerce para a experiência humana em todas as suas dimensões. Essa, a meu ver, a bússola da Universidade: rotas circulares e interconexas de conhecimentos - em permanente expansão - que permitem ao homem apropriar-se do universo e de si através da ciência.
Com o brilhantismo e a garra da coordenação do professor Ronaldo Salgado, há 18 anos a revista se propõe a sustentar tal estatuto. O de um saber amplo, republicano, democrático e humanizado. Em tempos de jornalismo cada vez mais "pragmático" e, no campo da linguagem - essa matéria-prima do saber -, cada vez mais telegráfico, ela nos é oferecida não como um contraponto, mas como a matriz diante da qual o radicalismo "de mercado" se encolhe, se percebe efêmero e anódino. Do campo da comunicação, a revista estende suas teias para os diversos outros campos do conhecimento através de longas e minuciosas entrevistas. Segue sua trilha propondo a experiência do debate como ponte, milhares de pontes simultâneas (e contraditórias posto que radicalmente humana), para destinos e sentidos imprevisíveis - mas que serão esquadrinhados e decantados pelo exercício tenaz e rigoroso dessa ciência do diálogo. Aos atalhos para o mercado, ela prefere outras curvas e veredas: solidárias e ensolaradas, como deve ser o saber.
Com a revista em mãos, percebe-se que o jornalismo, qual a universidade, pode mais porque a experiência humana pode mais.  É essa a potência-síntese proposta por Ronaldo a seus alunos e seus interlocutores.

4 comentários:

Ana Mary C. Cavalcante disse...

Texto e alma perfeitos, Felipão. Quem vivenciou essa experiência sabe do que falo. Não tiro (e nem me atrevo a colocar) uma palavra da sua percepção sobre a Entrevista, a Universidade, o Ronaldo Salgado e o Saber (assim, tudo maiúsculo). Apenas sublinho: "Em tempos de jornalismo cada vez mais 'pragmático' e, no campo da linguagem - essa matéria-prima do saber -, cada vez mais telegráfico, ela nos é oferecida não como um contraponto, mas como a matriz diante da qual o radicalismo 'de mercado' se encolhe, se percebe efêmero e anódino... Com a revista em mãos, percebe-se que o jornalismo, qual a universidade, pode mais porque a experiência humana pode mais." Muito boa reflexão, para quem já está na estrada e para quem está na estação. Abraços daqui,

Felipe Araújo disse...

Valeu, Mary. Seja bem vinda por essas bandas. Abração

Felipe Araújo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Prof. Tadeu Feitosa disse...

ESPETACULAR...