Apenas agora assisti ao badalado e controverso Amor, de Michael Haneke. Um dos filmes
mais humanos e delicados de que tenho notícia. Um libelo sobre o tema que lhe dá nome: amor romântico, mas não afetado; intenso mas gentilmente sóbrio; extraordinário mas
arraigadamente cotidiano. O profundo silêncio de sua narrativa me traduziu a
calma e a naturalidade diante da vida a que os amantes são tão íntimos. Não é
sobre amores de conveniência, mas sobre certa conveniência do amor – expresso
em sua mágica renovação na insignificância da rotina. O amor de Haneke é a
cumplicidade que atravessa horas de conversas, que traduz olhares, que
compartilha secretamente dores, mas primordialmente – e preciosamente – divide alegrias. Não
me pareceu um filme sobre eutanásia nem “contra” o amor, como alguns chegaram a
escrever. Pelo contrário. O filme celebra a vida, através da relação apaixonada
dos dois idosos protagonistas. Diante do ocaso físico de Emmanuele Riva,
brilhante em sua atuação, o casal tenta seguir adiante com a normalidade de um
cotidiano pontuado de pequenos gestos de amor. Aquém e além dele, há apenas vaidade, rancores, frustrações; há o mundo lá fora do qual os dois não querem notícia. E é quando a doença impede por
definitivo qualquer troca, qualquer cumplicidade, qualquer olhar entre os dois
– que seguiam amantes delicados mesmo nos momentos mais difíceis do entrecho
médico -, que se revela a atitude final. Tudo servirá como rito de passagem
para as memórias que seguirão. Nada, a rigor, foi interrompido. O amor é medida certa; ele sabe de
si e, em silêncio, sabe que restará.
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