quinta-feira, 23 de maio de 2013

L'État c'est moi!



Para o filósofo Claude Leforte, o Estado Democrático é sempre maior que o Estado de Direito. Ou seja, experimenta direitos que ainda não estão incorporados ao segundo. É, segundo ele, “o teatro da contestação cujo objeto não se reduz à conservação de um pacto tacitamente estabelecido, mas que se forma a partir de focos que o poder não pode dominar inteiramente”. Vladimir Safatle, em seu inquietante A esquerda que não teme dizer seu nome, faz uma leitura muito produtiva sobre o assunto. Trata-se, portanto, de uma noção a ser sempre tensionada na relação que promove entre a Justiça e o Direito. E, longe de solapar a democracia, lembra Safatle, é algo que a funda e fortalece.

Nos termos correntes da política local, nossa desventura é que esse tensionamento, essa superação, se dá em negativo. Não pelas vias da soberania popular; mas na esteira de comezinhas conveniências pessoais, pelo devir de um projeto de poder e, pior, pela afetação de certos homens públicos. O caso do ex- governador Ciro Gomes, que ocupa uma surreal posição institucional dentro (ou fora?) da Secretaria de Segurança, é por demais emblemático. A (pouco clara) movimentação de Ciro Gomes na Instituição e suas cornetadas públicas são típicas de quem vê a legalidade como algo a posteriori, não a priori. Nessa posição, ele não age a partir dos limites institucionais; mas vai de encontro aos mesmos, redesenhando e distorcendo esses preceitos ao sabor de valores nada republicanos.  

À luz do organograma do Governo, a atuação de Ciro é tão ilegítima quanto serão criminosas, uma vez comprovadas, as supostas milícias que ora denuncia (conseguirá efetivamente provar algo sobre o assunto?). O ex-deputado age como alguém que não suporta a dialética da política e que prefere trocar a palavra política pela palavra polícia (entendida aqui como violência simbólica/estatal). Entre o Estado Democrático e o Estado de Direito, Ciro parece optar pelo Estado de Luis XIV, aquele do "L'État c'est moi". 

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