O poeta está chegando aos 70. Mas prefere não antecipar as comemorações. “As pessoas têm falado muito sobre isso. Inclusive, já me convidaram para várias entrevistas e especiais. Eu falo: ‘Olha gente, se Deus permitir, deixa eu completar os 70 anos antes’. Festejar antes não é bom!”, explica, por telefone, aos risos. Oficialmente, o aniversário é apenas em novembro, dia 12. “Tenho evitado tocar nesse assunto. Mas, acontecendo isso, eu fazendo 70, aí vou falar à vontade”.
Até lá, Paulinho da Viola deixa a efeméride de lado e diz que prefere seguir trabalhando. Gravando – sim, há perspectiva de um novo disco em breve – e fazendo shows, como o que apresenta logo mais no Aterro da Praia de Iracema. O espetáculo foi pensado especialmente para a ocasião. Nos últimos anos, o sambista tem se apresentado num formato mais intimista, com um time de músicos mais enxuto. Resultado tanto do show acústico, que deu origem ao DVD da MTV; quanto de uma temporada que fez em São Paulo para inauguração do teatro da Fundação Álvares Penteado. O show em Fortaleza abriu uma exceção nessa rotina de perfil quase camerístico.
“É uma festa de aniversário”, justifica. Em conversa com a produção do evento, Paulinho decidiu por um show com uma sonoridade mais encorpada e com um repertório que prioriza seus grandes sucessos. Para isso, reforçou seu time de músicos: Cristóvão Bastos (piano), Mário Séve (sopros), Dininho (contrabaixo), Hércules (bateria), Celsinho Silva (percussão) e Esguleba (percussões).
Além deles, também sobem ao palco os filhos João Paulo Rabello (violão) – que substitui o avô César Farias como escudeiro de Paulinho no seis cordas - e Beatriz Faria (vocal) – destaque no elenco dos musicais Sassaricando e É com esse que eu vou, dois sucessos de público assinados pelo jornalista e escritor Sérgio Cabral.
Com quase 50 anos de carreira, Paulinho da Viola prefere falar de si no coletivo, avaliando e enaltecendo o legado de sua geração para a música brasileira. Uma geração em que alguns dos principais medalhões nasceram no mesmo ano (além dele, Benjor, Caetano, Gil e Milton, por exemplo, também são de 1942) e atualizaram, se não no campo da política e da economia, pelo menos no campo da música, a utopia do escritor austríaco Stefan Zweig – falecido em fevereiro daquele mesmo 1942 - e de seu País do Futuro.
“Fico feliz que o pessoal da minha geração, principalmente através dos festivais, tenha tido essa preocupação com as mudanças que vinham ocorrendo na cultura e no País como um todo”, afirma. “No período pós-bossa nova, houve muita mudança na música. Os festivais foram muito importantes porque eles não só deram oportunidade a toda uma geração de mostrar ideias novas, como também houve uma oportunidade de uma discussão sobre aquilo que estava acontecendo no País, na cultura”.
Maior referência viva do samba – pela qualidade, pela quantidade e pela popularidade de sua obra -, o compositor não reivindica a posição de reserva moral do gênero ou qualquer outro predicado do tipo. Em resumo, não se anima com nenhum protagonismo que lhe implique responsabilidades de preservação ou de manutenção de uma suposta pureza de nossa música.
“Preservação” e “pureza”, aliás, são expressões que considera inúteis dentro da dinâmica da música popular. “Nunca houve uma forma pura (de samba). Não dá pra ficar interferindo nas coisas e dizendo como elas têm de ser”, defende. “Eu não faço meu trabalho querendo preservar nada porque isso é uma bobagem e é desnecessário. Quem toma conta das coisas somos nós, é o nosso povo. Eu passei toda minha vida ouvindo em muitos momentos: ‘Ah, esse negócio acabou. É preciso acabar com isso. Isso é negócio de velho. E não sei o que’. E por que não acabou? Porque nosso povo não deixa”.
O sambista prefere falar em paixão pela arte do que em ativismo. “Eu sempre fui ligado a escolas de samba, a blocos de Carnaval, a música instrumental, ao choro. Isso é uma coisa da minha vida. Em nenhum momento, eu quis fazer uma revolução dentro disso. E não é porque tenha assumido uma postura de defesa disso ou daquilo. Não. É uma coisa muito simples. O que eu fiz, o que tenho feito, é uma coisa por amor”. Logo mais, Paulinho divide com Fortaleza algumas célebres canções que resultaram desse seu permanente amor ao samba e à vida. E também ao tempo presente.
* Texto publicado no jornal O POVO, edição do dia 13 de abril de 2012, por ocasião da programação de comemoração do aniversário de Fortaleza.