terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Macalé e Sampaio: os pontos fora da curva

Os dois principais pontos fora da curva da história "oficial" da música brasileira. Artistas que fizeram da margem o território livre, desgarrado, inquieto, de onde contemplaram, ironizaram e remexeram no "centro", no "mainstream". A cada nova geração de músicos que surge, eles se afirmam ainda mais criativos, corajosos e independentes. Pagaram o preço por tudo isso, naturalmente. Afinal, como na definição torquatiana, "Um poeta não se faz com versos/ é o risco/ é estar sempre a perigo/ sem medo".  Jards Macalé e Sérgio Sampaio, duas referências marginais que tensionaram o arco melódico, orquestral e poético da tal MPB. 




Mal Secreto

No início era Luiz Carlos dos Santos, que, contrariando o sonho da família de vê-lo formado médico, foi ter com violões, boemias e rodas de samba no morro do Estácio, antológico reduto de bambas na Zona Norte do Rio de Janeiro. Não saiu ''Doutor'' formado, mas graduou-se em suingue e malandragem, herdando o nome artístico do pai - seu Oswaldo ''Melodia'', craque do violão e do partido alto. Também não saiu sambista, mas sintetizou toda a atmosfera musical da favela - que se dividia entre a velha guarda do samba, a música nordestina e a jovem guarda - num estilo personalíssimo e inconfundível. Virou Luiz Melodia.

Abaixo, ele realiza um desejo de Waly Salomão, que gostaria de ouvir os versos de sua "Mal Secreto", musicada por Jards Macalé no começo dos anos 70, na voz de Melodia.


quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Poemetes Araújos - VII


Hesitação

Vertigem em pólos
Que antecipam
e esgarçam o passo.
Sola e salto. 
Trópicos de dúvida,
convexos altiplanos.
Lagunas de espírito: 
hesitação.

E se.
Sobre uma quase 
noite de verão: 
abismo e o fantasma de
mais um passo. 
Fim e recomeço;
dança e contradança.

Margem de si mesma,
minha convicção.

Orquestra e piano.
Concerto, 
opus incendiário,
paixão. Brahms maestoso!!!

Ou o que convém 
à melodia do tempo.


                             Fortaleza, janeiro de 2010
(Acima, o desenho "Maestoso", do norte-americano Jim Tansley)

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Cordas assanhadas

Junte o melhor regional de choro de todos os tempos ao maior improvisador e solista das cordas brasileiras e o resultado é este aí. "Assanhado", com Armandinho e Época de Ouro, numa versão cheia de ginga e dinâmica. 

Elio Gaspari e o "andar de baixo"

O professor Claudio Salm, do Departamento de Economia da UFRJ, se debruçou sobre os números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios referente ao período que vai de 1996 a 2008 para investigar a melhora de qualidade de vida do segmento mais pobre da população brasileira. No último fim de semana,  a conclusão de seu estudo foi tema da coluna de Elio Gaspari, que utiliza os números de Salm para tratar como "desonestidade"a propaganda lulista segundo a qual seu governo mudou radicalmente a "vida do andar de baixo nacional". De acordo com a coluna, que concentra sua análise nos números relativos aos domicílios com água encanada, acesso à rede de esgoto e acesso à luz elétrica, as PNADs mostram uma linha de crescimento contínuo em todo o período, sem alteração ou inflexão significativa no governo Lula. 
Os números da pesquisa de Claudio Salm são consistentes e não se pretende aqui questionar o mérito do trabalho do professor. Mas me soa como "desonestidade" deixar de fora da análise proposta pela coluna alguns números e informações que iluminam melhor o entendimento do País sob esse biombo das PNADs. Entre eles, o fato de que, nos últimos sete anos, o salário mínimo apresentou ganhos reais de 67%; a redução da dívida interna pública sem a venda de patrimônio nacional; e a grande geração de empregos formais, que tirou mais de 21 milhões de pessoas da pobreza no mesmo período. 
Em 2009, o "andar de baixo" (pelo menos não o brasileiro) não teve de pagar a fatura dos pilantras de Wall Street por conta do fortalecimento dos bancos públicos brasileiros, da facilitação do crédito por conta da alavancagem do financiamento público e da desoneração de setores fundamentais da economia. Tudo o que FHC não faria. Ou não fez em situações periféricas bem menos drásticas, quando se submeteu às exigências do FMI e "esgarçou nosso tecido social" (para usar uma expressão utilizada por Mercadante em artigo recente no Globo) com o aumento da pobreza e do desemprego. 
Em 2002, mais oito anos de FHC - que levou o País três vezes à bancarrota - transformariam o Brasil em pó. Sete anos de Lula reverteram um prognóstico tenebroso e colocaram o País num novo ciclo de desenvolvimento com uma atenção à área social nunca vista em nossa história. Seria "desonestidade" não ressaltar que o Brasil ainda convive com problemas crônicos, mantidos em grande escala pela inércio e pelas trapalhadas do Governo Lula em diversos setores. Mas não seria "desonestidade" maior do que o pretenso nivelamento dos dois últimos governos no que diz respeito à melhora da qualidade de vida dos setores mais pobres de nossa população. 

P.S. - A foto reproduzida acima é de um anúncio do instituto Akatu premiado em Cannes.